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Leite Derramado

Sou suspeito para falar de uma obra do Chico Buarque: costumo dizer que se tivesse que me apaixonar por um homem, seria por ele. Ainda assim, tento fazer um esforço para manter a devida distância.

Leite Derramado é um romance leve, simples, e que se lê num piscar de olhos. O narrador e falso protagonista é Eulálio Montenegro d’Assumpção, um centenário e caquético velhote que vai desfiando as suas memórias no leito de morte.

Basicamente, é a história de uma aristocracia (ou de um país) que se vai desmoronando ao longo dos tempos, e dos cacos que foram sobrando pelo caminho.

O ambiente do livro é ensombrado pela tristeza, mas uma tristeza imaginativa e mirabolante, que constantemente nos diverte e delicia. Volta e meia encontramo-nos perdidos nos labirintos da memória de Eulálio, em meio a peripécias baralhadas e desconexas. Às tantas já não sabemos (nem o próprio) de que Eulálio ou Eulalinho da família se fala, a quem se está dirigindo a narração, se o tom é coloquial ou ordinário, e nem tampouco conseguimos discernir os sentimentos que se pretendem expressar (ciúmes ou vergonha, ódio ou desprezo, e por aí vai).

Com tamanha obra e génio musical, Chico há-de sofrer sempre o preconceito de ser visto como um músico que escreve. É natural e justificado: foi ele próprio que colocou a fasquia demasiado elevada, e essa fasquia ainda está longe de ser atingida. Ainda assim, a sua marca na literatura brasileira já está presente, inquestionavelmente (até já estava com as suas letras, mas isso são outros quinhentos).

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One thought on “Leite Derramado

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